quarta-feira, 29 de novembro de 2017

Para Marisa Neute*

Marisa, a mãe de todas as mães
A que fecundada, cheia de graça, gerou
A vida que nunca se findará;
Marisa, a mãe de todas as mães
A que pariu, cheia de graça, filhos
Homens que a terra honrará;
Marisa, mulher, a mãe de todas as mães
Guerreira, missionária, deusa visionária
O filho que no ventre carregou
E que a vida, injusta, o tomou
A terra carrega e guarda para ti
Somente para ti, Marisa, mãe querida e amada por nós;
Teu filho nunca te abandonará
Pois o amor não se separa, não se divide,
Ele só aumenta e se multiplica
A espera do grande reencontro
Em que todas as perguntas se cessarão
Diante da resposta que para sempre nos calará todas as dúvidas;
E nos trará a clareza do amor como
Única certeza e glória desse laço infinito
Em que o tempo que nos foi roubado
Será recompensado por toda eternidade
De laços, abraços e alegrias sem fim.

Dedico a todas as mães que um dia enterraram seus filhos.


terça-feira, 21 de novembro de 2017

Dos dias sem fim.

Dos dias sem fim
Trazemos um pouco
De tudo que não teve fim...
Das nossas lutas inglórias
Das nossas poucas vitórias;
Ainda naqueles dias era possível sentir
O prazer de pular com os pés em poças d’águas nas calçadas
Que pareciam maiores que muitos oceanos
Ou eram meus pés pequenos demais para esse mundo?
Ainda com os pés pequenos e o coração gigante
Ouvia os gritos da minha vizinha pedindo socorro
As paredes pareciam abafar as porradas em sua face rubi
O marido, gordo, bêbado e de olhos imensos, não parava nunca
Acho que não parou até hoje...

Eu fui embora de lá ainda menina
Hoje, mulher, ainda ouço a vizinha pedir socorro
E me sinto culpada por não ter feito nada
E me sinto culpada por ninguém ter feito nada
E me sinto culpada por todos os homens gordos e bêbados
E me sinto culpada por ainda ouvir outras vozes, de outras
Mulheres, meninas, senhoras, prostitutas, adictas, bandidas
Minha mãe, minha avó, minha tia, minha filha e eu, sempre eu
No fundo de cada voz, no fundo de cada grito recolhido
No fundo do fundo do fundo de cada estampilho...
Dos dias sem fim

Trazemos um pouco
De tudo que não teve fim
Os meninos nas janelas do carro
Os homens nas esquinas com seus relógios
As mulheres que geram outras para gerarem o mundo
As sementes do passado que resistem e vingam
Mesmo em solo seco, pobre e ocre, renascem!
A violência como doutrinação
O preço dos olhos, do arroz e do feijão
Esse grito de não!
Os amores baratos
As paixões clandestinas
Nosso segredo velado
A verdade fatídica
Dos dias sem fim.



terça-feira, 14 de novembro de 2017

Desejo.

Desejo ardente desse seu beijo
                           desse seu jeito
                       desse seu queixo;

Desejo ardente dessa sua barba
                           dessa sua cara
                           dessa sua tara;

Desejo ardente que move a gente
                         que move o vento
                          que move a rede;

Desejo ardente que impulsiona
                                         a roda
                                       o motor
                                         a vida;

Desejo, desejo, desejo, desejo...
                           que transborda
                               que implode
                                que explode
Em mil estrelas cadentes no céu.


(Mariana de Almeida).




Todo mundo.

Todo mundo gosta de uma boa hipocrisia
Todo mundo gosta de acreditar em falsos mitos
Todo mundo gosta de fingir que o outro não existe...
Todo mundo gosta de julgar o que o outro vive
Todo mundo gosta de atravessar a mesma rua
Todo mundo gosta de fingir que não viu
Todo mundo gosta de escrever o que não leu
Todo mundo gosta da piada sem graça de domingo
Todo mundo gosta dos noticiários sensacionalistas
Todo mundo gosta de pets, mas de cão abandonado não
Todo mundo gosta de embrião, mas de adulto não
Todo mundo gosta de sacanagem, mas jura que não
Todo mundo gosta de tudo que é inventado
Todo mundo gosta da vida como ela não é
Todo mundo gosta de ser como não se é...
Todo mundo, menos eu e você...
Menos eu e você, meu bem.



segunda-feira, 6 de novembro de 2017

Urgente!


É urgente!
Eu preciso do poema certo!
Eu preciso das palavras certas!
Eu preciso do grito óbvio!

É urgente!
Todos estão surdos!
Todos estão cegos !
Todos estão mudos!

Mas é urgente,
Eu juro!
Meu grito mudo
Sufoca a palavra cega
Nesse murmúrio surdo

É urgente!
Eu te estendo minha mão
Eu ouso articular a palavra
Eu tento abrir seus olhos

É urgente!
Veja!
Ouça!
Sinta!
E grite o que eu não posso mais!
Nenhum poema vai me salvar
Do infinito abismo de ausências
Que cultivei dia a dia
Compondo minha mais bela ode
Para o triunfo final que nunca haverá.

É urgente!

(Mariana de Almeida).

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