quinta-feira, 4 de outubro de 2018

Passado.

Agora roubaram o passado
Esqueci a memória
Em algum canto da sala
Agora me perdi para sempre
Se não sei quem eu era
Como encontrar quem seria?
Agora está tudo confuso
Não me parece ser o futuro
Tudo tão parecido com o que já foi um dia
Tão diferente do que era certo para ser
Agora me pararam na rua
Insistem em me incomodar
É a polícia, eles não me deixam em paz
Me pararam em uma blitz
Me colocaram uma arma na cabeça
Sim, é uma arma, parece um fuzil
O comandante começa a gritar
Ele me pergunta tantas coisas que não sei
Eu realmente não me lembro de nada
Ele me pede a identidade
Eu a perdi, não adianta mais procurar
Não sei onde a deixei pela última vez
Esqueço-me lentamente de tudo
Mas lembro-me da palavra futuro
Fuzilada à queima roupa bem na minha frente
Ataque soviético, eles diziam e riam
Meu corpo tremia
Eu estava surda do presente
Eu estava morta para sempre
Impossivel lembrar de quem fui
Eu só queria um cigarro
O último cigarro, eu sei
Seria o melhor de todos
Eu agradeceria, sempre agradeci
Eu não poderia mais lembrar
Só me restava esquecer
Para sempre no passado
A minha identidade
Morta.

Imagem: Cena do Filme "Ensaio sobre a cegueira", inspirado no livro de mesmo título do José Saramago,  filmado em são Paulo, nas margens do Rio Pinheiro.

A imagem pode conter: uma ou mais pessoas, pessoas em pé, arranha-céu, céu e atividades ao ar livre

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